No Brasil o segmento de sedãs médios sempre foi dividido em dois. O lado Toyota Corolla, racional, confortável e às vezes sem graça. Do outro lado tínhamos os discípulos do Honda Civic, que prezavam pela boa dirigibilidade e visual ousado. Mas o segmento encolheu e não tende a se recuperar. Por isso o Volkswagen Jetta GLI vive sua própria realidade.
Quando a atual sétima geração surgiu, o Volkswagen Jetta deixou de ser um sedã tipicamente europeu, com tempero bem mais esportivo do que o do Honda Civic. Ele se adequou ao mercado norte-americano e passou por um processo de Corollização. Mas a versão GLI sempre pendeu para o seu lado original, tanto que foi a única que sobrou.
Há um certo tempo a Volkswagen já desistiu de vender versões de volume do Jetta porque percebeu que o cliente de Corolla não migrou para ela. Os clientes do modelo sempre foram aqueles da versão 2.0 TSI, que depois passaram a ser atendidos pelo GLI. Tanto que o esportivo foi sempre o que mais vendeu. E tem muitos motivos para isso.
Custo por cavalo
Por R$ 216.990, o Jetta GLI é R$ 25.200 mais caro que o Toyota Corolla Altis Premium (R$ 191.790), mas não poderia ser mais oposto que ele. O sedã japonês é híbrido, voltado ao consumo baixo. Já o Volkswagen é esportivo, rápido e, por mais absurdo que isso pareça, bem econômico!
Ainda que o preço seja salgado, ele é um dos modelos com menor custo por cavalo à venda no Brasil. São 231 cv providos pelo motor 2.0 TSI quatro cilindros turbo. Isso significa que você paga R$ 940 por cada cavalo. O torque é de 35,7 kgfm e bem sentido na hora de dirigir. Tudo isso é gerenciado por uma transmissão automatizada de dupla embreagem com sete marchas.
E por mais que esses números chamem atenção, o Jetta GLI sabe ser muito pacato e dócil quando preciso. Ele é um esportivo sem concessões, ou seja, quando é necessário andar devagar no anda e para dos grandes centros urbanos ou andar na estrada mais tranquilo, ele faz isso.
Em modo Eco ou normal, o GLI é silencioso, pacato, troca de marcha cedo e economiza combustível. Em um de nossos testes na estrada, ele marcou 14,1 km/l. Em um carro 2.0 turbo! Já a média geral ficou em 10,3 km/l por conta do trânsito pesado. Nessas horas, o sistema start-stop ajuda bastante e atua de maneira satisfatória.
Golf com bunda
Mas experimente acelerar o Jetta GLI. É nesse momento que ele honra a pegada esportiva a qual se propõe. As acelerações são fortes e o câmbio reage bem rápido, entendendo o momento de acelerar e o de segurar a marcha. Em modo Sport, o acelerador fica sensível, a direção mais rápida e pesada e o câmbio trabalha com mais agilidade e instigantes trancos.
Só que a Volkswagen adicionou ronco simulado no interior. É o mesmo sistema do Polo GTS, mas no hatch nacional a amplificação é mais natural e até divertida. No Jetta, porém, é tão falso que é possível escutar o som metalizado das caixas de som que reverberam no para-brisa o som do motor. Não ficou legal.
O comportamento do Jetta GLI na hora de acelerar é bastante bruto e completamente oposto ao que ele faz em modo normal. Tanto que qualquer aceleradinha é recebida com uma patada e o carro disparando. Usar o controle de largada é mais por diversão do que por precisão. Afinal, ele lixa os pneus, faz o maior escândalo e depois sai como um canhão.
Nas curvas, o comportamento é exemplar para um carro de tração dianteira. Por conta do bloqueio eletrônico de diferencial e vetorização de torque, é nitidamente sentido os momentos em que o Jetta GLI freia as rodas internas da curva para que ele possa fazer o traçado mais rápido. Ele aponta preciso como uma linha na agulha.
Só que na hora de retomar e acelerar, novamente ele lida com força demais nas rodas dianteiras e faz com que os pneus da frente cantem e percam levemente o controle. É algo bem sutil e controlável, mas que mostra que a barreira dos 230 cv pode começar a ser excessiva para um carro só com tração dianteira.
Curto e grosso
Para ter tal comportamento em curvas, o único grande sacrifício que o Jetta GLI faz é na suspensão. Na hora de tocar forte, é irrepreensível. Só que no dia a dia ela é um pouco dura. Passar em buracos vai assustar pela firmeza com que ele recebe o impacto, enquanto sua coluna pode ameaçar reclamar.
Já a direção é muito direta, são poucas voltas de batente a batente, o que garante ainda mais agilidade. Nas manobras é um pouco mais pesada que o necessário, mas nada grave. O que é uma falta imperdoável é o fato de o Jetta GLI não ter assistente de partida em rampa. Em uma saída de garagem na chuva, ele desceu para trás com tudo e ficou patinando para subir.
O único jeito de ter algum tipo de assistência de rampa é usar a função auto-hold. Nessa situação, o freio fica automaticamente pressionado até que o motorista acelere. Mesmo em linhas retas. Mas isso atrapalha na hora das manobras e, particularmente, é um sistema que sempre desligo nos carros que uso. No Jetta, fui obrigado a usar por segurança.
Isso é reflexo de alguns esquecimentos da Volkswagen na hora de equipar o modelo. Ele tem, por exemplo, piloto automático adaptativo e frenagem autônoma de emergência. Mas não conta com sistema de manutenção em faixa ou alerta de ponto cego. Os faróis são full-LED, mas não tem tecnologia IQ.Light como o Taos Highline ou futuramente o Polo GTS.
Apesar disso, vem bem recheado com bancos dianteiros com aquecimento e resfriamento, sendo o do motorista com regulagem elétrica, ar-condicionado de duas zonas, teto solar, assistente de luz alta, alerta de tráfego cruzado, controle de tração e estabilidade, retrovisores e vidros elétricos, central multimídia com Android Auto e Apple CarPlay sem fio, carregador de celular por indução, sensor de chuva e farol, painel digital e chave presencial.
Classe executiva e resto
Atualmente a Volkswagen não é referência em acabamento e isso se reflete no Jetta GLI. A parte dianteira é bem-feita, com bastante material macio no painel e uma faixa macia nas portas. Mas há bastante plástico duro nos demais cantos, em especial na traseira. Aliás, é lá que a Volkswagen economizou.
O encosto de cabeça traseiro é fixo e não há saída de ar para os passageiros da segunda fileira, algo que o Virtus oferece. Os painéis de porta são totalmente duros e têm somente uma mínima faixa macia onde o braço repousa. Espaço, ao menos, é farto. O porta-malas leva 510 litros, mas tem carpete de baixa qualidade e alças que invadem muito a área de carga.
Contrastando com isso temos painel de instrumentos digital e central multimídia referência na categoria. O painel tem tela de ótima definição e com boa personalização. Já a central é rápida, com tela que pouco se afeta com o sol, além de ser simples e fácil de usar. Entre os modelos na categoria, ele é o que tem a melhor combinação entre as duas telas.
Veredicto
A não ser que você precise andar na terra como em um SUV ou carregar um monte de tralha como em uma picape, sinceramente, não precisa de nada além de um Volkswagen Jetta GLI. Ele é esportivo na hora que precisa, mas também sabe ser econômico e dócil. Tem bom espaço interno e porta-malas amplo, além da lista de itens de série ser recheada.
Tem mancadas? Claro, como o acabamento da segunda fileira e do porta-malas, além de imperdoável falta de assistente de partida em rampa. Mas é um carro muito divertido de dirigir, bonito e moderno. Pensando que a diferença de preço para o sedã médio mais vendido do Brasil não é tão grande, se você quer se divertir e fugir da mesmice, o GLI é a pedida certa.
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