Quando me preparo semanalmente para escrever essa coluna, a criação acontece de um jeito curioso. Nasce com uma ideia. E evolui. Geralmente acaba tratando de outro tema. Nessa semana, a proposta inicial era aproveitar a experiência como jornalista automotivo nos anos 90, onde avaliei centenas de carros importados, para relembrar as marcas que ingressaram no mercado brasileiro… e depois saíram do país.
O único problema é que a coluna ficaria restrita a duas montadoras dignas de nota: Alfa Romeo e Mazda. Não posso dizer aqui que sinto saudade das demais – Asia Motors, Daewoo, Daihatsu, Lada e Seat. Respeitosamente, mas não fazem muita falta.
Já a Mazda faz. A Alfa? Pausa para enxugar uma lágrima.
Sou tão fã de Alfa que até gosto mais dela do que de Ferrari. A riquíssima história da marca do cuore sportivo, inclusive nas pistas, é somente um dos motivos. Ter criado o 8C 2900 Competizione, talvez o automóvel mais bonito de toda a fase de pré-guerra, é outro. E a 156 Sportwagon, a station mais charmosa da história? A lista é imponente: Montreal, 145, Spyder, 166, Giulia. Até o Stelvio! E eu não gosto de SUVs. Mas o Stelvio é lindo.
Nenhuma outra marca, dentre as centenas de carros que guiei na vida, possui uma relação de multiplicação tão direta da caixa de direção como os modelos da Alfa. Você faz curva de 90 graus, numa esquina, esterçando quase nada o volante. E o que os motores roncam?? Tesão puro para quem curte carro. O problema da Alfa é que há cada vez menos Edu´s no planeta.
Já a Mazda… Eram carros que me despertavam interesse nos anos 90. Mesclavam a tecnologia da Honda com o conforto da Toyota. Lembro de ter testado um 626, sedã que se encaixava entre o Civic e o Accord, e era bem legal. Tinha o 929 (sedã de quase 5 metros). E tinha o RX-7.
Pronto. Cheguei ao tema da coluna
Mazda RX-7. Quando lembrei dele, a ideia inicial evoluiu. Afinal, do mesmo modo que o cupê esportivo de motor rotativo Wankel desapareceu das prateleiras e não deixou substitutos, outros tantos carros icônicos ao longo das últimas décadas também não tiveram herdeiros.
Desde os primórdios, o que sempre tirou um carro de produção foi o próprio mercado, isto é, os baixos volumes de vendas. A montadora só obedecia ao desinteresse do público. De uns anos para cá dá para dizer que há outro fator: as leis antipoluentes (ou de segurança ativa e passiva). Alguns dos modelos que listarei abaixo não tiveram substitutos por não atenderem às novas legislações. Claro que é importante construir carros mais seguros e menos agressivos ao meio ambiente. Mas que dá saudade, dá.
Alguns até permanecem sendo produzidos em outros países. Outros pararam de vez. Tem de tudo na lista abaixo, inclusive modelos que nunca existiram no Brasil. Eis “minha lista” de dez (onze) veículos inesquecíveis.
Dodge Viper
Tudo se resume ao “1-10-9-4-3-6-5-8-7-2”: ordem de explosão do motor V10 de 8 litros desse superesportivo, produzido entre 1992 e 2017. Literalmente um motor de caminhão, essa unidade rendia 406 a 645 cv, dependendo da geração. Um ícone, inclusive pelo design característico com frente bem alongada, como os esportivos dos anos 60.
Honda Fit
Pesquise nos marketplaces automotivos e você verá que ele pouco desvaloriza até hoje, mesmo após 3 anos de sua descontinuação no Brasil. Versatilidade sempre foi sua maior característica, a ponto de gerar dificuldade até em classificá-lo: o Fit é um hatch altinho ou uma minivan/monovolume? E o pior: não há carros semelhantes hoje.
Honda NSX
Inspirado no caça aéreo F16, esse esportivo era todo construído em alumínio. Tornou mundialmente famosa a tecnologia VTEC, de variação de fase de abertura e permanência de válvulas. Até hoje espanta: virava 7.500 giros, com muito torque em baixa e potência na alta. Rendia de 280 cv a 320 cv. Foi o carro que atingi a maior velocidade máxima em um teste no Brasil: 258 km/h.
Lancia Delta HF Integrale
A italiana Lancia já tinha uma ótima performance histórica nos campeonatos mundiais de Rally, que vinha dos modelos Fulvia e Stratos. Mas aí ela pega esse pacato hatch familiar e faz… isso. O Delta HF Integrale venceu o Mundial de Construtores do WRC por seis anos (!!) consecutivos, de 1987 a 1992. Tinha motor 2 litros turbo e tração integral.
Mazda RX-7
Criado nos anos 20, o motor Wankel só ganhou relevância histórica com a Mazda. A terceira geração do RX7, a que conheci, era um biturbo sequencial (turbinho e turbão) que rendia 240 cv a partir de um motor com somente 1,3 litro de cilindrada. Desde que esse RX7 deixou de ser fabricado, em 2002, nunca mais tivemos outra arquitetura de motor de combustão interna que não fosse o de pistões alternativos convencionais.
Mitsubishi Pajero Full
Foi importado entre 1991 e 2021. Interessa-me falar da terceira geração, a partir de 1999. Ela tinha um sistema de carroceria monobloco com um chassi integrado. Na prática tinha a robustez dos suves dotados de longarinas com a solidez, a performance e o conforto do monobloco.
Renault Twingo
É bem pessoal: não conheci um hatch do segmento A tão interessante como a primeira geração do Twingo. Um carro desenhado de dentro pra fora, tal qual o VW Brasília, nos anos 70. Absurdamente espaçoso, ele quebrava o paradigma claustrofóbico dos compactos dos anos 90 – vale até menção honrosa ao Fiat Uno. Mas como o Twingo? Não, nada era igual.
Toyota Bandeirante
Proposta de jipe em sua definição mais genuína: utilitário 4×4, rústico, valente, robusto, sem as perfumarias de um SUV ou o espaço inútil da caçamba de picape. O Bandeirante povoa até hoje o interiorzão do Brasil com sua incrível capacidade off-road e mecânica parruda, simples de ser reparada.
Volkswagen Kombi
Nem é necessário gastar verbo: nunca mais haverá nenhum veículo que transporte uma tonelada de carga fechada com um custo tão acessível como a Kombi. Ponto final. A Kombi tem uma relevância histórica (social e econômica) maior que a do que carros como o Fusca. Mas poucos estão preparados para essa conversa.
Volkswagen Parati e Fiat Palio Weekend
Farei uma coluna só para falar das stations nas próximas semanas. Fiquei matutando se usaria a Parati ou a Palio Weekend como grande ícone desse segmento no país. Decidi elencar as duas. A da VW reinou absoluta nos anos 80 e 90 por oferecer um handling imbatível na categoria. Já a da Fiat assumiu o bastão depois de 2000, quando foi pioneira dos “crossovers nacionais” com a versão Adventure. Foram veículos importantíssimos e que não tiveram sucessores na conjunção de capacidade de porta-malas, conforto e performance.
E qual a sua lista? Me ajuda a lembrar de outros modelos. E até a próxima semana!