A grande maioria das marcas generalistas oferece transmissões automáticas convencionais, de dupla embreagem (DCT) ou continuamente variável (CVT) para beneficiar tanto o conforto quanto a dirigibilidade. Por isso, a Renault causou frisson quando anunciou a chegada do Kardian manual durante o Festival Interlagos, em agosto.
Em um segmento dominado pelas transmissões que dão férias ao pé esquerdo, devemos agradecer à Renault, pois o prazer de condução nunca é demais. Claro, existe uma questão mercadológica, e o preço a partir de R$ 106.990 do Kardian Evolution MT é mais barato comparado às versões Evolution EDC (R$ 118.090), Techno (R$ 129.990) e a topo de linha Première Edition (R$ 138.990).
O Renault Kardian não é o único da trupe com a caixa manual, dividindo os olhares com o Volkswagen Polo TSI (iniciais R$ 108.890) e o Fiat Pulse Drive 1.3 MT (R$ 107.990), para citar alguns. Outros carros, atualmente, com câmbio manual à venda pertencem a outros segmentos e são mais caros, como o Suzuki Jimny Sierra 4You MT (R$ 149.990), a Toyota Hilux Cabine Simples MT (R$ 236.690) e o radical Honda Civic Type R (R$ 429.990).
Ou seja, o câmbio manual continua vivo no Brasil e tem seu público na faixa dos R$ 100.000. Há inclusive uma parcela de consumidores que preferem esse tipo de câmbio ao invés de um sistema que troca automaticamente as marchas. Até a Porsche lançou recentemente em nosso mercado o 911 Carrera T nas carrocerias Coupé (R$ 929.000) e Cabriolet (R$ 991.000), equipados com a caixa manual.
Kardian manual tem a alma do Renault Sandero R.S.
Quando o Renault Sandero R.S. foi lançado no Brasil em 2015, na segunda geração do compacto, ele encantava pela condução afiada e pela união do propulsor de quatro cilindros 2.0 16V naturalmente aspirado em conjunto com o câmbio manual de seis marchas.
O resultado? Saudáveis 150 cv e 20,9 kgfm (etanol) bem calibrados pela divisão Renault Sport. Ao todo, teve mais de 4.600 unidades produzidas, inclusive em séries limitadas, como a Racing Spirit de 2017 (foto abaixo).
Depois do fim da vida do Renault Sandero R.S., podemos até dizer, guardadas as devidas proporções, que o Kardian manual tem a alma do hot hatch do fabricante descontinuado em 2022. Alguns podem até achar que estou perdendo as minhas faculdades mentais, mas basta andar poucos quilômetros para essa percepção aflorar. Quer ver?
Nascido da arquitetura RGMP, derivada da CMF-B europeia, sem dúvidas, o Kardian é o melhor produto da Renault no Brasil e sobram atributos para honrar esse título. Não apenas pela solidez do projeto, mas pela experiência de condução. Embora o Kardian Evolution MT não tenha pretensões de ser um esportivo, ele é um SUV bom de guiar e confortável.
Sob o Capô
O propulsor de três cilindros 1.0 turbo, com injeção direta e duplo comando de válvulas com variação na admissão e no escape, trabalha conjuntamente ao câmbio manual de seis marchas, rendendo 125 cv e 22,4 kgfm quando abastecido com etanol. São números de desempenho melhores que o Fiat Pulse Drive 1.3 naturalmente aspirado com câmbio manual de cinco marchas, que oferece 107 cv e 13,7 kgfm utilizando o combustível vegetal.
Ao volante, o Renault Kardian acorda rápido e vence brevemente a imobilidade, transmitindo um baixo turbolag (atraso antes de o turbocompressor pegar para valer). Aliás, a relação peso-potência de 9,30 kg/cv possibilita chegar aos 100 km/h em 11 segundos, com 180 km/h de velocidade máxima. No Renault Sandero R.S., eram 202 km/h e precisava de oito segundos para ir de 0 a 100 km/h, para relembrar.
O Kardian é o único utilitário esportivo turbinado com câmbio manual à venda em nosso mercado. Essa caixa bem escalonada oferece engates curtos e precisos – apenas o da sexta poderia ser ligeiramente melhor –, enquanto o pedal de embreagem macio e com pouco curso não cansa nos congestionamentos.
A primeira e a segunda marcha são mais longas, enquanto a terceira e a quarta encurtadas ajudam a diminuir a rotação. A relação da quinta marcha proporciona aproveitar o comportamento elástico do propulsor de três cilindros sobrealimentado, sendo a sexta um overdrive. Já a função ECO deixa as reações bem comedidas e é indicada para deslocamentos urbanos, enquanto há indicador de trocas de marchas.
Tudo isso, junto ao matrimônio do conjunto motriz, permite cravar médias de consumo de 12,3 km/l (cidade) e 14 km/l (estrada) utilizando gasolina, enquanto com etanol faz 8,4 km/l e 9,7 km/l, respectivamente, de acordo com o Programa de Etiquetagem Veicular do Inmetro (PBEV). É um consumo praticamente igual ao das configurações do Kardian com transmissão de dupla embreagem.
Dinâmica do Kardian manual
Bem nascido, o Kardian deve isso à plataforma RGMP, e a dinâmica o deixa (bem) divertido ao volante. As suspensões são McPherson à frente e por eixo de torção atrás, apresentando uma calibração firme na medida certa. Isso ajuda a dianteira a apontar com facilidade e impede uma rolagem excessiva da carroceria.
No frigir dos ovos, após um tempo ao volante do Kardian manual, fica a sensação de que estamos guiando um hatch. A Renault está um capítulo à parte quando o assunto é o acerto das suspensões, além da direção assistida eletricamente ser rápida ao esterço e ao retorno, cooperando na experiência de condução. São nuances que aproximam o Kardian manual do Sandero R.S.
O pedal do acelerador é voltado para o conforto, bem como o de freio apresenta um acionamento progressivo, e o conjunto de frenagem utiliza discos ventilados à frente e tambores na traseira. Eles ficam aparentes pelas rodas de aço de 16 polegadas cobertas por belas calotas, deixando a impressão de que as redondas são de liga leve. Os pneus de medidas 205/60 ajudam no trabalho das suspensões pelo perfil 60 na absorção dos impactos.
Outra qualidade do modelo da Renault está no raio de giro de 10,51 m, facilitando a vida do motorista na hora de manobrar em locais apertados, como nas vagas de shopping ou de prédios residenciais. A direção assistida eletricamente é leve ao esterço em baixas velocidades e transmite o peso correto ao transitar mais apressadamente.
Ao Abrir a Porta
O Kardian manual seduz pelo pacote de série parrudo, mesmo sendo uma versão de entrada. Ele oferece ar-condicionado digital, sensor e câmera de ré, seis airbags (frontais, laterais e de cortina), controle de tração e estabilidade, direção elétrica com ajuste de altura e profundidade, retrovisores elétricos e câmera de ré. O pacote ainda contempla assistente de frenagem com sinalização de emergência, sensores de estacionamento traseiros, assim como assistente de partida em aclives.
O acabamento é majoritariamente em plástico, mas de boa qualidade e texturizado. Os bancos são revestidos em tecido e acomodam muito bem o corpo, sendo confortáveis pela boa densidade das espumas. Os tecidos também aparecem nas portas dianteiras, enquanto as traseiras são todas em plástico.
A ergonomia bem pensada deixa todos os comandos à mão do motorista, e os comandos possuem um acionamento suave, enquanto a coluna amplamente ajustável em altura e profundidade permite encontrar rapidamente uma ótima posição de dirigir.
Apesar de todas as qualidades internas do Kardian manual, o multimídia flutuante de oito polegadas poderia ser melhor, não apenas pela velocidade aos toques na tela, mas também pelo sistema operacional. Contudo, há conectividade Android Auto e Apple CarPlay sem fio, mas o equipamento destoa da boa qualidade construtiva da cabine. Em contrapartida, o quadro de instrumentos é digital de sete polegadas.
Com 4,11 m de comprimento, 1,74 m de largura e 1,59 m de altura, a cabine acomoda cinco ocupantes, e o entre-eixos de 2,60 m entrega um bom espaço para as pernas e os joelhos de quem viaja na segunda fileira de bancos. Essa medida é maior em relação ao Fiat Pulse (2,53 m) e ao Volkswagen Nivus (2,56 m), para comparar.
No entanto, o porta-malas de 410 litros perde minimamente para os 415 litros do Volkswagen Nivus, sendo o compartimento de bagagens do Kardian manual superior ao do Fiat Pulse (370 litros).
Veredicto Kardian manual
O Renault Kardian manual é uma boa indicação de carro de entrada com câmbio manual por conta do projeto construtivo associado a boa dinâmica, o que transmite doses de diversão ao volante.
Por inicias R$ 106.990, ele cobra R$ 11.100 a menos que a versão Evolution edc (R$ 118.090). Para que não faz questão do câmbio de dupla embreagem é uma alternativa a ser considerada pela economia financeira da mesma forma que a dirigibilidade sedutora. É fazer um test-drive e fechar negócio!
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